Por William MacAskill (EA Forum – 2013)

1,4 mil milhões [Br. 1,4 bilhões] de pessoas vivem com menos de 1,25 dólares por dia. O que é que isso significa?
O que isso não significa é que essas pessoas estejam a viver com o que 1,25 dólares poderiam comprar, por exemplo, no Quénia. Caso pensasse desse modo, então poderia pensar que 1,25 dólares não é assim tão mau, porque o dinheiro vai muito mais longe nos países em desenvolvimento.
Infelizmente, o facto de o dinheiro ir mais longe nesses países já foi tido em conta. O que “1,25 dólares por dia” significa é o seguinte: as pessoas que vivem com este montante consomem os bens equivalentes ao que 1,25 dólares poderiam comprar nos EUA em 2005. Ou seja, o valor é ajustado à paridade do poder de compra (PPC). Isto significa que podemos calcular, em termos monetários, em que medida as pessoas no Quénia vivem abaixo dessa linha. Em 2005, o factor de conversão da paridade do poder de compra era de 1 dólar americano para 29,5 xelins quenianos. Assim, 1,25 dólares são cerca de 37 xelins quenianos. À taxa de câmbio do mercado (a taxa de hoje, pelo que, mais uma vez, esta é apenas uma estimativa aproximada), isso equivale a 44 cêntimos [Br. 44 centavos].
Uma vez que ainda estamos a falar de dinheiro de 2005, devemos ajustar face à inflação, pelo que, assumindo uma inflação de 3% ao ano (mais uma vez, mantendo o valor aproximado), são 56 cêntimos. Assim, na minha opinião, de forma mais precisa, deveríamos dizer que os pobres do mundo, pelo menos no Quénia – embora outros países com um nível equivalente de desenvolvimento económico tenham factores de conversão PPC semelhantes – vivem com 56 cêntimos por dia. Caramba!
No entanto, a história não acaba aqui, porque “1,25 dólares por dia” não se refere ao rendimento. Baseia-se em medidas de consumo. Assim, quando uma pessoa recolhe paus da floresta para seu uso pessoal – isso conta como “consumo”. Da mesma forma, tanto quanto sei, todos os serviços gratuitos prestados pelo governo também contam para este efeito.
Por isso, penso que uma forma mais intuitiva de pensar sobre a pobreza extrema é o seguinte: se dermos 56 cêntimos a uma pessoa queniana que viva abaixo dessa linha da pobreza, duplicamos o que ela pode consumir num dia.
Muitas pessoas que sabem isto sobre a linha de 1,25 dólares por dia, depois recusam-se a acreditar. Eu próprio tenho muita dificuldade em acreditar. Se alguém vivesse nos Estados Unidos com 1,25 dólares por dia, certamente morreria! (Ouvi isto ser defendido numa conferência sobre a pobreza por um académico que tinha escrito vários artigos sobre a pobreza).
Se nos estamos a referir ao rendimento, penso que isso simplesmente não é verdade. Com um rendimento de 1,25 dólares por dia, é possível ter uma qualidade de vida muito melhor do que a dos extremamente pobres. Podemos vasculhar o lixo e viver à custa dos excessos dos países ricos; têm acesso gratuito a estradas e iluminação, um bom sistema jurídico e protecção policial e assistência médica caso se fique doente. Conheço uma pessoa que viveu com 1000 dólares por ano durante alguns anos – várias vezes mais do que os extremamente pobres, mas tinha uma qualidade de vida bastante razoável.
No entanto, se estivermos a pensar no consumo e não no rendimento (como deveríamos), há uma diferença que torna enganadora a comparação com “1,25 dólares a viver nos EUA”: nos EUA simplesmente não se pode comprar o tipo de bens de baixa qualidade que se pode comprar nos países em desenvolvimento. Simplesmente não existem mercados para esses bens. Mesmo as lentilhas e o arroz mais básicos vendidos no Walmart nos EUA seriam considerados um artigo de luxo para pessoas que vivem com 1,25 dólares por dia.
Publicado originalmente por William MacAskill no EA Forum, em 17 de Maio de 202413.
Tradução de José Oliveira.
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