* As pessoas que você pensa que estão totalmente erradas podem na verdade não estar totalmente erradas.

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O Altruísmo Eficaz é muito abrangente
Como é óbvio para qualquer um que procure, o altruísmo eficaz se baseia mais em um interesse comum na questão de “como você pode fazer o maior bem” do que em qualquer posição consensual quanto à resposta. Todos nós temos amigos que apoiam:
- Uma vasta gama de diferentes áreas de causas.
- Uma vasta gama de abordagens diferentes para essas causas.
- Diferentes valores e filosofias morais sobre o que significa “ajudar os outros”.
- Diferentes pontos de vista políticos sobre a melhor forma de alcançar até mesmo as metas que compartilhamos. Sobre a política econômica, por exemplo, temos pessoas que cobrem toda a gama da extrema esquerda à extrema direita. Nos escritórios do CEA (Center of Effective Altruism) temos eleitores de cada grande partido político, e de alguns partidos menores também.
Olhando para além das crenças declaradas, também temos pessoas com uma ampla gama de temperamentos, desde as altamente argumentativas, confiantes e sinceras até às mais cautelosas, idiossincráticas e humildes.
Nossa ampla gama de pontos de vista poderia causar problemas
Há um ditado popular que diz que “os opostos se atraem”. Mas, infelizmente, os cientistas sociais descobriram que precisamente o oposto é verdade: diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és.
Um dos motores desse fenômeno é que as pessoas que são diferentes são mais propensas a entrar em conflitos umas com as outras. Se o meu parceiro e eu gostássemos de manter a casa exatamente da mesma maneira, certamente não teríamos tantas discussões sobre limpeza (vou deixá-los especular sobre quem é o desarrumado!). As pessoas que são diferentes de você podem, inicialmente, parecer-lhe apenas divertidas, peculiares ou enganadas, mas quando você fala com elas durante algum tempo e elas não vêem a razão, você pode começar a vê-las como estúpidas, tendenciosas, rudes, impossíveis de lidar e até talvez pessoas mesmo más.
Um movimento reunido em torno de um interesse comum sobre a questão “o que devemos fazer?” terá inevitavelmente uma maior diversidade de prioridades e justificações para essas prioridades, do que um movimento unido por uma resposta em comum. Esta é, em muitos aspectos, a nossa força central. A manutenção de uma diversidade de pontos de vista significa que somos menos propensos a ficar permanentemente presos no caminho errado, porque podemos aprender com o conhecimento e experiências dos outros, e corrigir nosso curso, se necessário.
No entanto, isso também significa que estamos necessariamente comprometidos com o pluralismo ideológico. Embora seja possível manter os movimentos sociais como um “pega-tudo”, eles enfrentam alguns desafios. Quanto mais as pessoas tiverem opiniões que outros não gostem, mais pontos de atrito existirão que poderão levar-nos a formar opiniões negativas sobre os demais. Já houve fortes trocas de palavras on-line demonstrando este risco.
Quando uma minoria detém um ponto de vista impopular pode se sentir atacada e intimidada, enquanto a maioria se sente intrigada e frustrada por um pequeno grupo de pessoas não ver a verdade óbvia que tantos aceitam.
Meu primeiro objetivo com este post é fazer com que tomemos consciência deste fenômeno, e dar o meu apoio a uma cultura de coexistência pacífica entre as pessoas que, mesmo depois de compartilharem todos os seus argumentos e refletirem, ainda discordem.
Meu segundo objetivo é oferecer algumas ações específicas que podem nos ajudar a evitar conflitos interpessoais que não contribuam para tornar o mundo um lugar melhor:
1. Lembre-se que você pode estar errado
Por mais difícil que seja manter isso em mente quando está falando com alguém que discorda fortemente de você, é sempre possível que eles tenham bons pontos para fazer você mudar de ideia, mesmo que só um pouco. A maioria das afirmações são apenas “parcialmente verdadeiras ou falsas”, e há quase sempre algo valioso que pode aprender com alguém que discorda de você, mesmo que seja apenas uma compreensão de como ela pensa.
Se a outra pessoa parece ser tão inteligente e informada sobre o tema quanto você, não fica sequer claro porque haveria de dar mais peso à sua própria opinião do que à delas.
2. Seja educado, especialmente, se o seu interlocutor não o for
Ser educado fará com que seja mais provável que, tanto a pessoa com quem está falando, como os demais espectadores, se aproximem do seu ponto de vista. Isso também significa que seja menos provável que participe em uma luta que machuque os outros e absorva o seu precioso tempo e energia emocional.
Polidez tem muitos componentes, alguns dos mais notáveis são: não criticar alguém pessoalmente; interpretar o seu comportamento e declarações de forma bastante caridosa; não ser exibicionista, paternalista nem embaraçar os outros publicamente; respeitar os outros como seus iguais, mesmo se achar que eles não o são; aceitar quando eles apresentarem um ponto relevante; e, finalmente, manter a conversa centrada em informações que podem ser compartilhadas, confirmadas e que sejam realmente convincentes.
3. Não presumir más intenções
Mesmo que seja comum os seres humanos cometerem erros em seu pensamento, é incomum que estejam francamente desinteressados no bem-estar dos demais e naquilo que é certo, especialmente neste movimento. Mesmo que estejam, provavelmente não estarão cientes de que esse será o caso. E mesmo que estejam conscientes, você não vai ser bem visto por quem observa, tratando-os como se tivessem más intenções.
Se você realmente ficar convencido de que a pessoa com quem está conversando, está de má fé, é hora de ir embora. Como se costuma dizer: não alimente os trolls.
4. Mantenha a calma
Mesmo quando as pessoas dizem coisas que merecem raiva e indignação, expressar raiva ou indignação publicamente raramente vai fazer do mundo um lugar melhor. A raiva ser compreensível ou natural é muito diferente de ser útil, especialmente se é provável que a outra pessoa vá retaliar com a sua própria raiva.
Estar com raiva não melhora a qualidade de seu pensamento, não persuade os outros de que está certo, não faz você mais feliz, produtivo, nem torna uma comunidade mais harmoniosa.
Em defesa da raiva, ela pode ser altamente motivadora. Infelizmente não diferencia entre motivar você a fazer coisas valiosas, ineficazes ou prejudiciais.
Qualquer técnica para mantê-lo calmo é, portanto, útil. Se algo está o deixando inevitavelmente com raiva, é melhor se afastar e deixar que outras pessoas lidem com isso.
5. Escolha suas batalhas
Nem todas as coisas são igualmente importantes para se chegar a um consenso sobre elas. Para o bem ou para o mal, a maioria das coisas em que gastamos nossos dias conversando não são “ações relevantes”. Se você está a abeirar-se de conflitos interpessoais sobre uma questão que i) não vai alterar muito as ações de ninguém; ii) não vai fazer do mundo um lugar muito melhor, mesmo que as pessoas mudem suas ações; ou iii) é muito difícil convencer os outros sobre isso, talvez não valha a pena o custo da tensão interpessoal ao explorar isso em detalhe.
Então, se alguém na comunidade diz algo não relacionado ou periférico sobre o altruísmo eficaz, com o qual não concorde, e que poderia se transformar em um conflito, você sempre tem a opção de não morder a isca. Em uma semana, tanto você como eles podem nem sequer se lembrar do que foi mencionado, muito menos considerá-lo merecedor para que se prejudique ou acabe com o vosso relacionamento.
6. Deixe pra lá
O conselho mais importante de todos.
Talvez você esteja discutindo algo importante. Talvez você tenha apresentado ótimos argumentos. Talvez todos os seus conhecidos concordem com você. Você foi educado, caridoso e manteve a calma. Mas a pessoa com quem está falando ainda mantém uma visão de que você discorda fortemente e acredita ser prejudicial.
Se este for o caso, é provavelmente hora de ambos se afastarem antes que as opiniões de um sobre o outro desçam demasiado, ou que o desacordo descambe em sectarismo. Se ninguém pode ser convencido, você pode pelo menos evitar a criação de uma animosidade entre ambos, que faça com que nunca mais se aproximem. Você já fez o que podia, por hora, isso é suficiente.
Esperemos que o tempo mostre qual de vocês está certo, ou que a distância do debate público dê a um de vocês a chance de mudar de ideias em privado sem sentir-se diminuído. Enquanto isso talvez vocês não possam trabalhar juntos, mas poderão, pelo menos, permanecer amistosos e respeitosos.
Não é provável, ou mesmo desejável, que acabemos sempre concordando uns com os outros em tudo. O mundo é um lugar terrivelmente complexo; se as perguntas que estamos fazendo tivessem respostas fáceis, as pesquisas que estamos fazendo não seriam sequer necessárias em primeiro lugar.
O custo de fazer parte de uma comunidade que acolhe e se interessa pelos seus pontos de vista, mesmo que muitos pensem que você está indo na direção errada, é ser tolerante com os outros da mesma maneira, mesmo que ache que os pontos de vista deles são prejudiciais.
Então, às vezes, você apenas tem que deixar pra lá.
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PS: Se concorda comigo sobre o que disse acima, você pode ser tentado a postar ou enviar o post às pessoas cada vez que eles não estejam jogando por estas regras. Infelizmente, é provável que isso seja contraproducente e leve a mais conflitos e não a menos. É útil compartilhar este post de maneira geral, mas não o use como uma forma de policiamento dos outros. A maneira mais eficaz de promover este estilo de interação é exemplificar isso na maneira de tratar os outros, e não entrar em longas conversas com pessoas que têm formas menos produtivas de conversar.
Agradeço à Amanda, ao Will, à Diana, à Michelle, à Catriona, ao Marek, ao Niel, à Tonja, ao Sam e ao George pelos seus comentários aos rascunhos deste post.
Artigo postado originalmente por Robert Wiblin no Effective Altruism Forum, em 24 de fevereiro de 2015
Tradução Thiago Tamosauskas. Revisão José Oliveira.