Estudo: Dar dinheiro às mães reduz para metade o número de mortes de bebés

$ = – 50% mortalidade infantil? (Arte digital: José Oliveira | Fotografia: Sian Labay, Jonathan Borba e Jane Lush)

Resumo:

  • 🤰🏽 Um estudo aleatório realizado no Quénia revelou que dar às famílias uma transferência em dinheiro de 1000 dólares da GiveDirectly reduziu imediatamente a mortalidade infantil em 48%.

  • 🏥 A maior redução na mortalidade verificou-se entre as mães que viviam perto de unidades de saúde com médicos e entre aquelas que receberam dinheiro nas semanas anteriores ao parto.  

  • 🩺 A GiveDirectly está a lançar um novo programa para maximizar esses impactos que salvam vidas, em parceria com um prestador de serviços de saúde comunitária do Quénia, para levar dinheiro a mais mulheres grávidas.

Na zona rural do Quénia, dar às famílias pobres uma transferência única de 1000 dólares reduziu a mortalidade infantil quase pela metade, uma das maiores reduções alguma vez registadas num programa de combate à pobreza. Com os orçamentos globais de ajuda a diminuir e os financiadores sob pressão para fazer mais com menos, estas conclusões apontam para o dinheiro como uma ferramenta poderosa e subutilizada para reduzir mortes evitáveis.

O dinheiro reduziu a mortalidade infantil em 48%

O estudo, conduzido por investigadores da Universidade da Califórnia em Berkeley e de Oxford, acompanhou mais de 100 000 nascimentos e mostrou que a mortalidade infantil diminuiu 48% nos anos em que as famílias receberam uma transferência única de 1000 dólares da GiveDirectly.

É um resultado notável, que reforça o que décadas de investigação já tinham demonstrado: a pobreza em si é um dos maiores factores de risco para a sobrevivência de uma criança. Como observam os investigadores, “a mortalidade infantil e juvenil parece ser altamente sensível às condições económicas”.

O dinheiro salvou vidas ao permitir às novas mães descansar, alimentar-se e dar à luz em segurança

Os maiores benefícios verificaram-se entre os recém-nascidos: as mortes nos primeiros 30 dias de vida de um bebé diminuíram 63%, com reduções nas causas de morte materna e neonatal a representarem mais de metade do decréscimo geral da mortalidade infantil. 

Esta descida foi impulsionada por um aumento de 45% nos partos hospitalares e por uma diminuição de 51% do trabalho (muitas vezes fisicamente extenuante) durante o terceiro trimestre de gravidez e no período pós-parto. A diminuição do trabalho no final da gravidez coincidiu com uma diminuição das mortes por complicações no parto.  

Quando as mães têm dinheiro, procuram cuidados, provando que, por vezes, a melhor forma de salvar a vida de uma criança é simplesmente dar dinheiro à sua mãe.

Veja o gráfico interactivo aqui

O dinheiro teve maior impacto quando foi entregue perto do nascimento e combinado com o acesso a cuidados de saúde

🗓️ A altura certa foi crucial. Os investigadores observaram que “os benefícios para a sobrevivência infantil concentram-se nas mulheres que receberam dinheiro no mês em que deram à luz ou pouco antes”. As transferências feitas mais cedo ou mais tarde tiveram impactos menores.

🏥 O acesso aos cuidados de saúde foi igualmente crucial. A mortalidade infantil diminuiu mais nas aldeias mais próximas de unidades de saúde com médicos, onde as mães podiam aceder com maior facilidade e pagar serviços de saúde de qualidade.

 Segundo os autores, este padrão sugere que “as transferências monetárias podem complementar, em vez de substituir, os investimentos em infra-estruturas de saúde rurais”.

O dinheiro está entre as melhores ferramentas que temos para salvar a vida das crianças

📊 As transferências incondicionais de dinheiro tiveram um impacto comparável ao das principais intervenções globais de saúde. O nosso programa reduziu a mortalidade infantil tanto quanto a distribuição de vacinas e medicamentos contra a malária, mesmo não tendo sido concebido especificamente para esse fim. Isto sugere que o dinheiro directo deveria integrar o conjunto de ferramentas de saúde pública, funcionando em complementaridade com sistemas de saúde bem estruturados.[1]

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Embora o programa de transferência de dinheiro em larga escala deste estudo seja, naturalmente, mais dispendioso por família do que outros programas globais de saúde, os investigadores assinalam que, se o dinheiro fosse direccionado a mulheres grávidas no terceiro trimestre, poderia ser “comparativamente tão custo-eficaz como várias intervenções de saúde materno-infantil recomendadas pela OMS, mesmo sem levar em consideração outros possíveis benefícios das transferências incondicionais de dinheiro (como o aumento do consumo)”.

No Outono deste ano, lançaremos um projecto-piloto no Quénia, destinado especificamente a mulheres grávidas, para avaliar até que ponto o dinheiro pode melhorar de forma ainda mais custo-eficaz a saúde materno-infantil, um dos nossos muitos testes para melhorar os nossos programas em função de resultados específicos.

💵 O dinheiro também impulsiona muitas medidas económicas. Grandes transferências únicas já demonstraram não só salvar vidas, mas também melhorar diversas dimensões da pobreza extrema. Um estudo anterior do mesmo programa no Quénia mostrou que esses 1000 dólares reduziram directamente a pobreza e estimularam o crescimento da economia local:

Estamos a desenvolver novos programas de saúde materna e neonatal com base nestes resultados

Com base nestes resultados, estamos a testar um novo programa que transfere dinheiro para mulheres grávidas em zonas rurais do Quénia, em parceria com entidades governamentais locais e a Lwala Community Alliance.

A GiveDirectly fornecerá dinheiro, em complemento aos serviços de saúde existentes, para ajudar as mulheres a suportar custos críticos durante a gravidez, o parto e a recuperação pós-parto, maximizando assim o nosso impacto.

Este modelo será testado em dois países, com o lançamento de um programa semelhante na República Democrática do Congo, em parceria com a Fundação Panzi.

O dinheiro é uma ferramenta pouco utilizada para acabar com as mortes infantis evitáveis

Este estudo vem reforçar o número crescente de provas de que fazer chegar dinheiro às famílias certas, no momento certo, pode prevenir o sofrimento antes que aconteça.

Com os orçamentos globais de ajuda humanitária a diminuir em 21 mil milhões de dólares este ano, os sistemas de saúde enfrentam a pressão de fazer mais com menos, e os líderes estão a repensar formas de proteger os mais vulneráveis.

Como afirmou recentemente Bill Gates, precisamos de novas formas de “colocar o mundo no caminho certo para pôr fim às mortes evitáveis de mães e bebés”. Este novo estudo mostra que o dinheiro tem um enorme potencial para atingir esse objectivo.


Anexo: Como sabemos que o dinheiro salvou vidas (Perguntas frequentes sobre os métodos)

O dinheiro já foi muito estudado. Porque nunca vimos este impacto antes?

Este é o primeiro estudo controlado aleatório (ECA) com dimensão suficiente para medir de forma fiável se o dinheiro reduz a mortalidade infantil. Os estudos anteriores já indicavam que o dinheiro provavelmente ajuda, mas a maioria utilizava métodos não aleatórios, que não conseguiam excluir totalmente outras explicações, ou tinha uma dimensão demasiado reduzida para permitir conclusões sólidas. 

Isto deve-se ao facto de que estudar a mortalidade exige o seguinte:

  • Amostras de grande dimensão: as mortes são normalmente medidas por cada 1000 nascimentos, pelo que até mudanças relevantes são difíceis de detectar sem inquéritos a dezenas de milhares de pessoas.
  • Dados rigorosos sobre nascimentos: muitos locais com elevada mortalidade infantil não têm registos de nascimentos, o que torna impossível estudar as alterações na mortalidade ao longo do tempo.

Então, como é que este estudo conseguiu medir a relação entre mortalidade e dinheiro?

Reuniram-se duas condições raras:

  1. Um vasto programa aleatório de transferências de dinheiro: entre 2014 e 2017, a GiveDirectly distribuiu 1000 dólares a mais de 10 500 famílias em 653 aldeias na região rural de Siaya, no Quénia. As aldeias foram seleccionadas aleatoriamente para receber (ou não) o dinheiro, permitindo aos investigadores medir os efeitos tanto nos beneficiários como nos seus vizinhos.
  2. Um levantamento rigoroso e de longo prazo dos nascimentos: tal como a maioria dos locais que enfrentam pobreza extrema, Siaya, no Quénia, não dispunha de registos de nascimentos fiáveis. Para colmatar esta lacuna, os investigadores apoiados pela GiveWell realizaram um censo completo em 2023, recolhendo dados de 107 000 mulheres e registando mais de 100 000 nascimentos desde 2011.

Graças a estas condições, os investigadores puderam finalmente isolar o impacto do dinheiro na mortalidade numa escala suficiente.

Explore o mapa abaixo para ver a área de estudo, que inclui as aldeias de tratamento e de controlo. A proximidade permitiu aos investigadores medir tanto os impactos individuais como os efeitos mais amplos a nível das comunidades.

Ver o gráfico interactivo aqui

Como é possível monitorizar 100 000 nascimentos sem registos hospitalares?

Para colmatar a lacuna dos registos incompletos de nascimentos e óbitos, os investigadores recorreram a autópsias verbais, ou seja, a entrevistas estruturadas e presenciais com cuidadores. Este método é padronizado, aprovado pela Organização Mundial de Saúde e amplamente utilizado quando não existem registos médicos disponíveis.

As equipas deslocaram-se de porta em porta na área do estudo para recolher esses históricos, construindo o quadro mais completo possível dos nascimentos e da sobrevivência infantil durante o período do estudo.

^ Nota:

  1. O nosso objectivo com esta tabela comparativa é mostrar que o impacto do dinheiro foi significativo — comparável a outras intervenções globais de saúde altamente eficazes. Isto significa que as transferências incondicionais de dinheiro são uma ferramenta promissora para a saúde pública, o que actualmente não é uma crença comum.


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